Ao lado de Max Ernst e Salvador Dali, René Magritte foi um dos
principais nomes da pintura surrealista no século XX
“Essa é uma união
que sugere o mistério essencial do mundo. Arte para mim não é um fim em
si, mas um meio de evocar esse mistério”, afirmou certa vez René
Magritte, procurando explicar o motivo de seu uso frequente na pintura,
da justaposição de objetos que aparentemente não se relacionariam. Essa
foi uma das melhores definições dadas pelo pintor a respeito do sentido
de sua atividade artística, não apenas para ele, mas para o grupo
surrealista como um todo.
Nessa
pequena citação, Magritte partia da premissa que já havia sido exposta
em 1924, pelo primeiro Manifesto do Surrealismo, de André Breton,
tomando de empréstimo e reelaborando a definição que primeiro fora
exposta por Pierre Reverdy.
Para
o surrealismo, movimento essencialmente antiliterário e antiartístico, a
arte já não era, como o foi para muitas vanguardas, um fim em si mesma,
mas um mero veículo para que fossem trazidos à tona determinados
aspectos da realidade de outra forma ocultos. A arte, ao ser encarada
como uma ferramenta dessa natureza, perdia também seu valor absoluto, e
passava a ser vista apenas como um meio entre tantos outros capaz de
trazer à tona essa realidade invisível, essa supra-realidade da vida.
O homem de chapéu coco. |
Uma
parte expressiva dos surrealistas, ao se deparar com essa verdade,
desenvolveram, por sua vez, obras totalmente inusitadas, que, se em
alguns casos parecia beirar os limites do que se convencionou ser
considerado uma obra de arte, em outros casos parecia ter atravessado
totalmente essa fronteira, a ponto do próprio conceito
da arte se tornar algo incerto até os dias atuais. Uma teoria que
desferiu um golpe decisivo sobre a arte já em processo de crise desde o
final do século XIX.
A
obra de René Magritte seria toda permeada por essa ideia. Uma de suas
telas mais famosas brinca com a verdade que o observador atribui ao
ilusionismo pictórico. Após pintar um cachimbo sobre uma tela usando uma
técnica de trompe-l'oeil, ele escreveria abaixo a curiosa frase: “Isso
não é um cachimbo”. Era uma pintura tradicional e ao mesmo tempo uma
obra de antiarte à maneira dadaísta.
Apesar
de Magritte e os demais pintores do grupo serem identificados pelo
rótulo de surrealistas, é importante destacar que cada um desses
artistas seguiu um caminho radicalmente distinto em sua arte.
Max
Ernst teve uma forte influência do primeiro De Chirico, executando
trabalhos que traziam o forte clima de mistério presentes na pintura do
italiano. As obras de Ernst, porém, eram surrealistas não apenas em seu
conteúdo, mas também nas técnicas empregadas. O pintor aplicou o
automatismo psíquico à sua pintura, flertou com técnicas que utilizavam o
acaso e introduziu novos materiais que estimulavam sua imaginação.
Entre os surrealistas, Ernst foi formalmente o mais experimental. Um
caminho parecido seguiram outros surrealistas como, por exemplo André
Masson.
Isso não é um cachimbo. |
Dali era já um pintor que dominava perfeitamente as técnicas de representação
acadêmicas, e as utilizou com um sentido, sobretudo, emocional, dando
forma a um mundo aberrante, com suas mulheres voadoras e animais
monstruosos em cenários terríveis, como que saídos de pesadelos.
Diferente
desses artistas, entre os quais muitos outros poderiam ser citados,
René Magritte desenvolveu uma obra, acima de tudo, intelectual, que
mantinha uma forte ligação com os ready mades
de Marcel Duchamp. Criações concebidas não tanto para deleitar o olhar,
mas para apresentar uma determinada ideia, eram obras conceituais.
Magritte
trabalhou muito subvertendo determinadas noções da realidade e
convenções artísticas. São famosos, por exemplo, seus retratos
surrealistas que apresentam um homem de terno com o rosto sempre oculto,
estando ele, ou de costas, ou com a face coberta por uma pomba ou uma
maçã. Ideia que subverte a noção convencional de retrato. Também são
típicas em suas obras retratos de estranhos casais se abraçando ou se
beijando com seus rostos cobertos por um saco.
Outras obras bastante características do artista são telas como O império das luzes,
onde Magritte combina com bastante perfeição uma paisagem noturna com
um céu diurno, remetendo de uma só vez ao dia e à noite. Ou ainda,
pinturas que se utilizam da representação do espelho para subverter sua
função real. Em uma dessas obras, Reprodução interdita,
um homem aparece de costas, olhando-se no espelho, mas seu reflexo no
espelho, ao invés de mostrar seu rosto, está igualmente de costas.
Quadros
também característicos na pintura de Magritte apresentam figuras
humanas grotescas, como um quadro em que podem ser vistas cinco figuras
bizarras que se resumem a pernas e braços, ou as sereias invertidas que
aparecem em diferentes telas, com cabeça e tronco de peixe e pernas
humanas.
No
Brasil, infelizmente, exposições da obra do artista são pouco comuns. A
maioria de seus trabalhos estão hoje concentrados no Museu Magritte,
fundado em Bruxelas em 2009. Passados 45 anos de sua morte, a obra de
Magritte permanece como uma das criações mais originais da pintura
moderna, subproduto das teorias revolucionárias do surrealismo. Ideias
que ajudaram a destruir as noções mais convencionais e superficiais que
se tinha sobre a arte e a revelar o seu sentido mais profundo.
Reprodução interdita. |
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