Em cartaz em São Paulo, a mostra apresenta uma retrospectiva
abrangente com os principais filmes da carreira do diretor, com destaque
para seus documentários ‘autorais’ anteriores à sua fase ‘nouvelle
vague’
Está
em cartaz na Cinemateca Brasileira, na zona sul de São Paulo, uma
mostra abrangente de filmes do cineasta francês Alain Resnais, que se
notabilizou na década de 1950 associado ao movimento da nouvelle vague.
Ao
longo de mais de cinco décadas de atividade, Renais ficou conhecido por
seus filmes altamente subjetivos e experimentais, um cinema tipicamente
“de autor”, que era uma das premissas da nouvelle vague.
Renais foi sempre um admirador dos movimentos vanguardistas em arte. Em 1951 produziu o documentário Guernica, a sobre o bombardeio à cidade espanhola e tomando como fio condutor do filme a obra-prima de Pablo Picasso.
Depois disso, já em sua fase nouvelle vague, Resnais realisou Hiroshima meu amor e O ano passado em Marienbad, filmes feitos em parceria com dois dos maiores nomes do noveau roman francês, Alain Robbe-Grillet e Marguerite Duras, que escreveram os roteiros.
Dessa
maneira, já no início da década de 1960, Renais era tido como o mais
vanguardista e hermético dos diretores da nova geração do cinema
francês.
O
interessante dessa mostra atualmente em cartaz na Cinemateca é conhecer
justamente a produção, toda ela de documentários, de Resnais que
antecede sua vinculação com a nouvelle vague. Tais filmes revelam que Resnais perseguia já um cinema autoral bem antes dos críticos da Cahiers du Cinéma
teorizarem esses princípios. Como um cineasta mais velho do que
Truffaut, Godard, Rohmer e outros, Resnais foi uma inspiração para os
novos cineastas antes de vir a formar um movimento com eles, indicando,
portanto, a tendência geral por onde seguiria o cinema francês nas
décadas seguintes.
A produção mais antiga presente na mostra é justamente Guernica,
que já traz essa marca “autoral” do cinema de Resnais. O filme não é
uma narrativa convencional sobre a devastação da cidade pelo bombardeio
fascista, mas um documentário poético, que se desenvolve todo a partir
de uma narração dramática, que intercala imagens emocionalmente
impactantes de diversas obras de Picasso produzidas durante as décadas
de 1930 e 40.
Seguem essa mesma tendência os documentários seguintes do diretor. Noite e neblina,
de 1955, que alterna imagens contemporâneas das instalações dos campos
de concentração nazistas abandonados, com imagens do período da guerra,
acompanhado também por uma narração poética.
Em O canto do estireno, de 1958, que retrata a fabricação do
plástico na França, esses princípios são levados a um maior radicalismo,
e a narração é toda feita em versos alexandrinos, compostos pelo
escritor Raymond Queneau.
Depois
desses filmes, Resnais ingressa na fase nouvelle vague e realiza seus
dois longa-metragem ficcionais mais importantes, os já citados Hiroshima meu amor e O ano passado em Marienbad.
Esse segundo filme, de 1961, é o mais radical da filmografia do
diretor, que tem a virtude de colocar totalmente de lado as
“necessidades comerciais” do cinema e realiza um filme indigesto para
muitos espectadores, mas que constitui um experimento extremamente
pertinente na época, usando para a forma narrativa do filme, o movimento
literário mais avançado surgido no segundo pós-guerra mundialmente. O ano passado em Marienbad é um filme que poucos diretores teriam a coragem, a liberdade e o desprendimento necessário para fazer.
Resnais manteve esse estilo de cinema e essa influência do noveau roman também em seus filmes seguintes, entre os quais se destaca Muriel,
de 1963, que também trata dos traumas da guerra, agora um homem que é
assombrado pelas lembranças dos horrores que presenciou na Guerra da
Argélia.
O
tema dos traumas de guerra foi de fato durante muito tempo o tema
principal dos filmes de Resnais, tema cujas técnicas expressivas que
encontrou se aplicam perfeitamente, como pode se ver em A guerra acabou, de 1966, sobre um militante comunista espanhol que participou da Guerra Civil; e Loin du Vietnam, produção coletiva realizada como um protesto contra Guerra do Vietnã.
Muitos
outros filmes de Resnais estão também presentes na mostra, adentrando
em suas produções das décadas de 1970, 80 e 90. É uma boa oportunidade
para se conhecer esse que é um dos criadores centrais do cinema francês
da segunda metade do século. Confira abaixo a programação completa da
mostra.
Programação:
12.09 – Quarta-feira
Sala Cinemateca Petrobras
18h30 Amores Parisienses
21h00 Loin du Vietnam
13.09 – Quinta-feira
Sala Cinemateca Petrobras
18h00 Smoking
20h30 Guernica | As Estátuas Também Morrem | Noite e Neblina | Toda A Memória Do Mundo | O Canto do Estireno
14.09 - Sexta-feira
Sala Cinemateca Petrobras
18h00 Pour Esteban González, González, Cuba | A Guerra Acabou
20h30 Loin du Vietnam
19.09 - Quarta-feira
Sala Cinemateca Petrobras
18h30 Meu Tio da América
20h30 Muriel
20.09 - Quinta-feira
Sala Cinemateca BNDES
18h30 Stavisky ou O Império de Alexandre
20h30 Pour Esteban González, González, Cuba | A Guerra Acabou
21.09 - Sexta-feira
Sala Cinemateca Petrobras
19h00 O Ano Passado em Marienbad
21h00 Meu Tio da América
22.09 - Sábado
Sala Cinemateca Petrobras
19h30 Pour Esteban González, González, Cuba | A Guerra Acabou
23.09 - Domingo
Sala Cinemateca Petrobras
15h00 Amores Parisienses
17h30 No Smoking
20h00 Smoking
Sinopses:
Guernica, de Alain Resnais e Robert Hessens
França, 1951, 35mm, pb, 13’ | Legendas em português
O
bombardeamento de Guernica pela aviação nazista, em favor de Franco, é
evocado através do afresco de Picasso e de outras de suas obras.
As estátuas também morrem (Les statues meurent aussi), de Alain Resnais e Chris Marker
França, 1953, 35mm, pb, 29’ | Legendas em português
Documentário
sobre a arte negra, combinando imagens de estátuas africanas a um texto
de Chris Marker que denuncia a opressão e a destruição de uma arte e de
um povo por outro. Manifesto anti-colonialista, recebeu o Prêmio Jean
Vigo de 1954.
Noite e neblina (Nuit et brouillard), de Alain Resnais
França, 1955, 35mm, cor/pb, 32’ | Legendas em português
Encomendado
pelo Comitê de História da Segunda Guerra Mundial, o filme alterna as
paisagens serenas e coloridas dos campos de concentração nazistas no
presente a imagens de arquivo que retratam os horrores do passado.
Toda a memória do mundo (Toute la mémoire du monde), de Alain Resnais
França, 1956, 35mm, pb, 22’ | Legendas em português | Exibição em DVD
Num passeio pelos corredores da Biblioteca Nacional Francesa, o documentário discute a memória e o legado de nossa civilização.
O canto do estireno (Le chant du styrène), de Alain Resnais
França, 1958, 35mm, cor, 14’ | Legendas em português | Exibição em DVD
Documentário
poético sobre a fabricação do plástico, aliando imagens do processo
industrial filmadas em Cinemascope a uma narração em versos alexandrinos
compostos pelo escritor francês Raymond Queneau, autor do romance Zazie
no metrô.
Hiroshima meu amor (Hiroshima mon amour), de Alain Resnais
França/Japão, 1959, 35mm, pb, 90’ | Legendas em português
Emmanuelle Riva, Eiji Okada, Stella Dassas, Pierre Barbaud
Uma
atriz francesa, em visita a Hiroshima devastada pela guerra para atuar
num filme sobre a paz, se envolve com um arquiteto japonês que
sobreviveu ao bombardeio. O romance a faz relembrar seu antigo amor por
um soldado alemão que conheceu em Nevers, na França, no final da Segunda
Guerra. Primeiro longa-metragem de Resnais, com roteiro da escritora e
cineasta Marguerite Duras.
O ano passado em Marienbad (L'année dernière à Marienbad), de Alain Resnais
França/Itália, 1961, 35mm, pb, 94’ | Legendas em português
Delphine Seyrig, Giorgio Albertazzi, Sacha Pitoëff, Françoise Bertin
Num
luxuoso hotel, um homem tenta fazer com que uma mulher se lembre do
romance que supostamente tiveram um ano antes. Explorando a arquitetura
do hotel, Resnais fez um de seus filmes mais impactantes. Com roteiro do
escritor Alain Robbe-Grillet, O ano passado em Marienbad apresenta uma narrativa não-linear, permeada pelo mundo dos sonhos e pelos labirintos da memória. Marienbad é um marco da nouvelle vague. Recebeu o Leão de Ouro no Festival de Veneza de 1961 e indicação ao Oscar de melhor roteiro original em 1963.
Muriel (Muriel ou le temps d'un retour), de Alain Resnais
França/Itália, 1963, 35mm, cor, 116’ | Legendas em português
Delphine Seyring, Jean-Pierre Kérien, Nita Klein, Jean- Baptiste Thiérrée
Viúva
reencontra um antigo amor da juventude e com isso consegue se livrar do
tédio que parece contaminar sua existência. Enquanto isso, seu jovem
enteado é assombrado por memórias de uma atrocidade que testemunhou
durante a guerra da Argélia, quando uma jovem chamada Muriel foi
torturada até a morte. Terceiro longa-metragem do diretor Alain Resnais,
que novamente contou com a colaboração do escritor e roteirista Jean
Cayrol, responsável pelo texto do curta-metragem Noite e neblina, o filme dá sequência às investigações já presentes em seus curtas-metragens e em seus dois longas anteriores, Hiroshima mon amour e O ano passado em Marienbad, nos quais como aqui, misturam-se passado e presente e realidade e imaginação para dar conta dos efeitos do tempo e da memória.
A guerra acabou (La guerre est finie), de Alain Resnais
França/Suíça, 1966, 35mm, pb, 121’ | Legendas em português | Exibição em 16mm
Yves Montand, Ingrid Thulin, Geneviève Bujold, Jean Dasté
Militante
comunista espanhol vai a Paris com um nome falso e tenta encontrar um
antigo companheiro. Seu objetivo é impedir que o colega regresse à
Espanha, onde poderá ser preso pela polícia franquista. Indicado ao
Oscar de Melhor roteiro em 1968. Fotografia de Sacha Vierny.
Loin du Vietnam, de Alain Resnais, Chris Marker, Jean-Luc Godard, Agnès Varda, Joris Ivens, William Klein e Claude Lelouch
França, 1967, 35mm, cor, 115’ | Legendas em português
Supervisionado pelo cineasta Chris Marker (1921-2012), Loin du Vietnam
foi rodado por um coletivo de diretores e técnicos, entre eles Jean-Luc
Godard, Agnès Varda e Alain Resnais. Trata-se de um manifesto contra a
Guerra do Vietnã e os norte-americanos, em favor dos vietnamitas.
Segundo Marker, “se algum dia um filme francês mereceu ser chamado
coletivo, foi bem este, a ponto de perguntarmos, durante sua realização,
quem fazia o quê”.
Stavisky ou O império de Alexandre (Stavisky... ), de Alain Resnais
França/Itália, 1974, 35mm, cor, 115’ | Legendas em português
Jean-Paul Belmondo, Charles Boyer, François Périer, Michael Lonsdale
Inspirado
na vida do industrial francês Alexandre Stavisky. Ele utiliza seu
charme e talento para fazer amizade com influentes membros da elite
industrial e política francesa. No entanto, ao armar um grande golpe,
envolve-se num escândalo que quase leva o país a uma guerra civil.
Música do compositor americano Stephen Sondheim. Roteiro de Jorge
Semprún. Por sua atuação, Charles Boyer recebeu o Prêmio de Melhor ator
no Festival de Cannes de 1974. Stavisky também foi indicado a Palma de
Ouro.
Meu tio da América (Mon oncle d'Amérique), de Alain Resnais
França, 1980, 35mm, cor, 125’ | Legendas em português
Gérard Depardieu, Nicole Garcia, Roger Pierre, Henri Laborit
Os
destinos cruzados de três personagens sob o olhar de outro: o biólogo
Henri Laborit, que explica sua teoria sobre como o ambiente interfere na
formação da personalidade dos seres humanos. Os objetos de investigação
são dois homens e uma mulher, de cidades, origens sociais e famílias
diferentes.
Pour Esteban González, González, Cuba, de Alain Resnais
França, 1991, 35mm, cor, 3’ | Legendas em português | Exibição em beta analógica
Uma
carta filmada endereçada à Fidel Castro para pedir a libertação de um
preso político. Filme realizado a convite da Anistia Internacional,
dentro do longa coletivo Contre l'oubli, que contou com a participação de vários
cineastas, entre eles Godard, Claire Denis e Costa-Gravas. O curta é
inédito no Brasil.
Smoking, de Alain Resnais
França, 1993, 35mm, cor, 140’ | Legendas em português
Sabine Azéma, Pierre Arditi, Peter Hudson
Oito
histórias diferentes que tratam da vida de cinco mulheres, todas
interpretadas por uma só atriz, e de quatro homens, também interpretados
pelo mesmo ator. A narrativa trata das escolhas que cada um pode fazer
em sua vida. Adaptação da peça Intimate Exchanges, do dramaturgo Alan Ayckbourn, o filme forma um duplo com No smoking e recebeu o Urso de Prata no Festival de Berlim em 1994.
No smoking, de Alain Resnais
França, 1993, 35mm, cor, 144’ | Legendas em português
Sabine Azéma, Pierre Arditi, Peter Hudson
Oito
histórias diferentes que tratam da vida de cinco mulheres, todas
interpretadas por uma só atriz, e de quatro homens, também interpretados
pelo mesmo ator. A narrativa trata das escolhas que cada um pode fazer
em sua vida. Adaptação da peça Intimate Exchanges, do dramaturgo Alan Ayckbourn, o filme forma um duplo com Smoking e recebeu o Urso de Prata no Festival de Berlim em 1994.
Amores parisienses (On connaît la chanson), de Alain Resnais
França, 1997, 35mm, cor, 120’ | Legendas em português
Pierre Arditi, Sabine Azéma, Agnès Jaoui, Jane Birkin
As
rotinas profissionais e os desencontros amorosos de seis personagens.
Musical dirigido por Resnais, que utiliza canções populares francesas
para ilustrar a ciranda sentimental de suas personagens. Sucesso de
bilheteria, Amores parisienses recebeu sete prêmios César e o Prêmio Louis Delluc.
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