terça-feira, 29 de novembro de 2011

115 anos da morte de Anton Bruckner

11 de outubro de 2011 

O compositor, cujo aniversário se completa hoje, foi uma personalidade improvável da história da música; um provinciano iletrado que, ligado ao importante movimento musical germânico, foi capaz de produzir obras de raro valor

Anton Bruckner foi um dos mais interessantes nomes da escola musical austríaca. Foi também uma personalidade singular da história da música, uma das mais curiosas. Como artista, desenvolveu uma obra extraordinária, situado entre os melhores compositores da riquíssima tradição musical germânica. O homem por trás desta música, no entanto, é uma figura inesperada.

Nascido em uma longínqua aldeia da Áustria Alta, foi criado por padres em um mosteiro barroco. Nunca aprendeu a ler e era um devoto fiel da Igreja, foi um camponês suburbano, acostumado a tocar com diletantes sem grande formação. Ele cresceu fazendo suas músicas entre diferentes aldeias, e, mais velho, tornou-se organista em uma catedral do interior austríaco. Sua experiência de vida, em outras palavras era magra. Beato, nunca se a aproximou de uma mulher, chegando a reconhecer, em certa ocasião – isso o destaca o crítico Otto Maria Carpeaux – que nunca conseguiu entender os sentimentos que motivaram a ópera Tristão e Isolda, de Wagner, por nunca ter experimentado o amor. Bruckner foi assim, um caso exemplar de ignorância na história da música. Alguns de seus biógrafos têm destacado que Bruckner tinha realmente problemas mentais e sofria de graves crises patológicas.

Obviamente que de instrumentistas como ele a Europa estava infestada naquela época. Ele tinha tudo para tornar-se mais um organista anônimo das tantas igrejas de província naquele Império Austríaco. O que é espantoso, porém, foi ter se tornado o grande músico que viria a se revelar.

O único dado que pode elucidar a contradição por trás da vida e obra de Bruckner é o fato de que ele não foi um talento isolado em seu tempo, mas, de alguma forma, foi capaz de ligar-se a um movimento musical da maior importância que estava em pleno desenvolvimento não apenas na Áustria, mas em toda Europa.

Bruckner pertenceu à mais importante tradição musical europeia: a da música germânica. E viveu em sua época em um dos momentos culminantes de desenvolvimento desta música: a época do nacionalismo de Wagner, da música que se alimentava da luta pela unificação dos Estados germânicos. Foi após conhecer as composições wagnerianas que Bruckner vai abandonando sua música de província e passa a tentar copiar o mestre do romantismo tardio em obras que rapidamente foram adquirindo cada vez mais qualidade.


Na juventude, Bruckner não produziu nada de verdadeiramente importante. Ele tinha mais de 40 anos quando começou a escrever suas primeiras peças de real valor, sempre sob a influência da música grandiloquente de Wagner. Eram então os anos culminantes do nacionalismo alemão, ao longo da década de precedeu a unificação: 1860.


Não era, porém, só de Wagner em vivia a música germânica. Foi também a época de ouro de Brahms e da reação ao neo-romantismo wagneriano, que levaram ao resgate de toda tradição romântica anterior da música alemã, de Mendelsonn, Beethoven, Shummann, etc. Os embates entre estas diferentes correntes germânicas alimentaram um movimento musical de grande vitalidade em toda a região. Em oposição ao predomínio desta tradição, começavam a surgir também dezenas de dissidentes nas nações submetidas ao jugo dos Habsburgos, os nacionalismos húngaro, tcheco, italiano, croata, etc.


A música de Bruckner, não por acaso, era também nacionalista. Habitante das províncias, vivendo entre os camponeses pobres, as melodias folclóricas estavam impregnadas em sua cultura e foram transmitidas com grande originalidade para sua música a partir das ideias wagnerianas. Sua música foi, deste modo, mais uma das tantas manifestações daquela época contra o imperialismo austríaco. O wagnerianismo era uma música essencial anti-austríaca, formada a partir de sua busca pela ruptura dos Estados alemães com a influência estranguladora dos Habsburgos. Como músico das províncias e dos camponeses, as composições de Bruckner colocavam-se também em oposição ao classicismo vienense.


A ignorância de Bruckner agiu positivamente sobre suas composições. Ela abriu caminho para uma grande originalidade musical cujo resultado foi obras-primas da música alemã de todos os tempos: sua bela Sinfonia nº 4, as obras-primas sinfônicas, nº 5 e nº 7; e a maior de todas, a Sinfonia nº 8, considerando-se que sua sinfonia final, nº 9, também de grande valor, permaneceu inconclusa por sua morte.


Durante muitos anos houve resistência à música de Anton Bruckner, tida por seus contemporâneos justamente como uma música restritiva, estranha à sensibilidade geral por ser excessivamente ligada às suas raízes regionalistas. Mais tarde, seria justamente estas qualidades que levariam dezenas de jovens compositores a se interessarem por esta música e a se tornarem brucknerianos.

O músico efetuou uma aplicação puramente espontânea do programa romântico, sem a busca ideológica e consciente que levou outros grandes compositores alemães a seguirem este caminho.

Bruckner foi assim um caso exemplar do homem comum, geralmente medíocre, que, conseguindo se ligar a um movimento geral de sua época, foi capaz de realizar algo cuja importância estava muito além de sua compreensão.

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