terça-feira, 4 de outubro de 2011

As esculturas modernistas de Antoine Bourdelle

Em 1º de outubro de 1929, morria o escultor francês, um dos pioneiros do modernismo na escultura

2 de outubro de 2011


Antoine Bourdelle foi um dos artistas franceses que viveram exatamente o período de transição entre a escultura do século XIX e do século XX, e sua obra reflete muito fortemente essa passagem, constituída a partir de um equilíbrio entre o velho e o novo, ou, de outro ponto de vista, uma obra de transição, mais apegada ao passado do que o foi a Rodin, o maior nome da escultura moderna neste período.

O momento em que Bourdelle opera a transição do romantismo para técnicas já típicas do modernismo é exatamente o período subsequente à popularização da pintura impressionista em Paris, e constituía uma importante adaptação daquelas ideias para o campo da escultura.
Bourdelle nasceu em 1861, filho de carpinteiro, e por isso, cresceu em contato com as esculturas em madeira. Aos 15 ele ingressava já na Escola de Belas Artes de Toulouse, e partiu para o ambiente cultural cosmopolita de Paris apenas de 1884.

Na capital francesa, a grande novidade do mundo artístico eram as pinturas revolucionárias de Monet, Renoir, Degas, Sisley, etc., cujas técnicas dispensavam o minucioso acabamento exigido pelo academicismo em voga. Eles rejeitavam as alegorias e cenas históricas, pintando ao contrário, cenas da vida contemporânea em Paris, privilegiando a sensação de movimento e o caráter fugaz das imagens que capturavam.

Uma das cabeças da série Beethoven, de Bourdelle.
Foram estes conceitos elementares que influenciaram profundamente os trabalhos de Bourdelle a partir do final da década. Em 1888 ele inicia sua série mais importante, a qual ele se ocuparia ao longo de toda a vida. Um grupo numeroso de bustos e máscaras de Ludwig van Beethoven. Foi um tema que o escultor desenvolveu incessantemente, pesquisando as variações no resultado, fruto das técnicas que empregava em cada peça.

As representações de Beethoven estavam para a obra de Bourdelle, como as figuras alongadas estavam para Giacometti, como o tema do pássaro estava para a obra de Brancusi ou a figura feminina para a produção de Rodin. Representavam um estudo cuidadoso das novas técnicas escultóricas.

São obras de extraordinária qualidade. A falta de polimento, o aspecto inacabado destas peças, as distorções expressivas nas feições do compositor, tudo contribuía para torna-las peças emocionalmente carregadas. Das mais impactantes já realizadas. Bourdelle perseguiu até sua morte a representação ideal do compositor, aquela que fosse capaz de transmitir toda a profundidade e grandiosidade das criações do mestre alemão. Era particularmente extravagante o uso que Bourdelle fazia dos cabelos de Beethoven, apresentados sempre revoltos à maneira romântica, e cumprindo um papel importante na transmissão dos sentimentos de arrebatamento nestas suas peças.

A obra de Bourdelle dá um salto de qualidade em 1893, quando passa a trabalhar no ateliê de Auguste Rodin, onde torna-se também um influente processor. Duas décadas mais velho que Bourdelle, Rodin era o principal expoente daquele movimento de ruptura da escultura com as técnicas do século XIX.

Hércules Aqueiro.
Por estes anos, Bourdelle já nutria grande interesse pelas esculturas monumentais, estudando as obras do período grego arcaico, e as produções góticas da europa medieval. Seu estilo pessoal, por isso, se caracteriza por um grande ecletismo, criando tanto obras de inspiração romântica, como sua série de Beethoven; quanto clássicas, cujo exemplo mais extraordinário é o seu Hércules, o Arqueiro, que sintetiza a beleza estática do classicismo, com a percepção do movimento e da ação. Se poderia dizer que Bourdelle se inspirou em obras como o Discóbolo de Mirón, mas a tensão física exagerada de sua peça revela, ao contrário, suas influências de Rodin e do impressionismo.

Suas técnicas modernistas de forte influência classicista o tornariam um escultor oficial da Terceira República francesa a partir do momento em que ele passa a realizar suas peças monumentais na década de 1890. São dele obras bastante tradicionais de Paris, como os frisos classicistas que decoram o Teatro da Champs Elysées, ou o monumento às vítimas da guerra Franco-Prussiana de 1871.

No caso das obras deste teatro, vê-se mais uma vez muito facilmente a influência do grego arcaico, em obras que adaptam as feições típicas daquela tradição, à paixão de Bourdelle pelo movimento. O que dotava suas criações de uma abordagem muito particular. Suas figuras gregas ondulantes pareciam dançar o balé modernista de Isadora Duncan.

Os relevos de Burdelle no Teatro da Camps Elysées.
Outro de seus monumentos significativos é a Virgem da Oferenda, de 1922. Com mais de 20 metros de altura, esta peça mistura todas as suas referências pessoais. O tema e a pose, tão tipicamente medievais, com a Virgem sustentando a imagem do pequeno Cristo. À maneira das pinturas góticas, a criança não é retratada à maneira naturalista, mas como um ícone. Cristo jaz de pé, com os braços abertos, na pose da crucificação.

O classicismo grego nesta obra se revela pela nobreza com que o tema é tratado e a rigidez do conjunto, que deixa de lado a leveza da estatuária gótica.
A estas referências une-se o tratamento modernista, a simplificação das formas e a forte geometrização onde se percebe influências cubistas.

Com esta obra “católica”, que era uma identificação flagrante do artista com a ideologia da burguesia francesa, Bourdelle é “oficializado”, recebendo em 1924 a Legião de Honra do governo. Foi a conclusão daquelas quase três décadas de serviços à Terceira República.
Apesar desta completa assimilação do escultor pela classe dominante francesa. Sua obra teria ainda relativa influência sobre os artistas da Escola de Paris. 

Foram seus discípulos alguns dos escultores mais influentes do século XX, como Alberto Giacometti, Béni Ferenczy, Alfredo Bigatti, Aristide Maillol, Samuel Cashwan, Pablo Curatella Manes e Vera Mukhina, entre outros. Vê-se também sua influência nas pinturas de Picasso em seu período neoclássico, ao longo da década de 1920. 

O escultor morreu em sua residência, em 1929, em Le Vésinet, nos arredores de Paris.

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